Do cinema e industrialização à panificação e moda. O Centro de Memória Bunge (CMB), um dos mais ricos acervos de memória empresarial do Brasil, preserva documentos textuais, iconográficos, tridimensionais e audiovisuais que recontam a industrialização do país, e, especialmente, a história da capital paulista. São mais de 1,5 milhão de fotos, vídeos, documentos e peças preservadas pelo acervo que recontam não só a história da Bunge, que está há mais de 100 anos no Brasil, mas também grande parcela da história de importantes estabelecimentos da cidade, responsáveis pelo desenvolvimento da capital.
1- Cinema: produções ao ar livre e criação do Cine São Bento
A Bunge teve um papel essencial para a disseminação do cinema brasileiro. Ainda em seu início, as produções eram contempladas ao ar livre, com os chamados “cinemas de rua” e, em 1907, começaram a surgir as primeiras salas de exibição, localizadas em avenidas como a São João e a Celso Garcia, além de ruas como a Augusta, a Direita e a São Bento, na capital paulista.
Ao chegar no Brasil, a Bunge também passa a difundir a Sétima Arte para a população paulistana por meio do Cine São Bento, sala de exibição inaugurada em 1927 no centro de São Paulo. O CMB possui fotos e uma carta com detalhes da compra e da reforma do casarão, assinada por João Ugliengo, um dos nomes mais conhecidos da indústria paulista e responsável pela abertura do cinema. O Cine São Bento fechou as portas em 1950 e, daquele período, resta apenas a fachada, tombada como patrimônio cultural da cidade.
2- Industrialização: capital paulista como polo administrativo de companhias e Barra Funda, na zona oeste, como “vila industrial”
A história do desenvolvimento de São Paulo se mistura com as decisões dos donos de grandes indústrias que, no século XX, chegaram à capital paulista e estabeleceram o centro da cidade como polo administrativo de seus negócios, iniciando o processo de urbanização dos bairros tradicionais como: Jaguaré, Belenzinho, Mooca além de Brooklin, Cambuci, Água Branca e Tatuapé, onde foram inauguradas as fábricas de tecidos, percussoras da indústria têxtil brasileira.
Na época, a Barra Funda passou a despertar interesse de muitas empresas, especialmente pela sua localização, no entroncamento ferroviário das estações da Estrada de Ferro Sorocabana, que ligava a capital ao interior, e São Paulo Railway, primeira ferrovia do Estado de São Paulo. A Moinho Santista, que produzia cereais, e a SANBRA, que fabricava óleo de algodão, estavam no grupo das primeiras indústrias que se instalaram na região. A industrialização absorveu trabalhadores imigrantes e nacionais e, até meados do século XX, a Barra Funda era conhecida pelas vilas industriais. Hoje, a região é mais residencial e está na mira do mercado imobiliário.
Com a abertura dos portos e modernização das ferrovias, a sociedade paulistana do século XX, habituada a copiar costumes europeus, conheceu o pão trazido pelos portugueses. Na época, empreendimentos voltados para moagem de trigo, panificadoras e produtos voltados para esse segmento passaram a ser criados. Apesar da panificação no Brasil estar vinculada às tradições portuguesas, foi com os imigrantes italianos que chegaram a São Paulo que essa cultura se expandiu.O Centro de Memória Bunge possui em seu acervo importantes registros históricos deste processo, com documentos e fotos sobre as primeiras padarias do país. Além disso, o local mantém e preserva um rico acervo de propagandas da época, como o anúncio de rua de 1920 da Farinha de Trigo São Leopoldo, em Belo Horizonte -MG.
Quem passa pela Avenida Vital Brasil, no bairro do Butantã, onde hoje funciona a Escola Estadual Alberto Torres, não imagina que o local abrigou o famoso Grupo Escolar do Butantã, a primeira escola de ensino rural do estado de São Paulo. Fundada em 1932, a escola ficou internacionalmente conhecida por ser um projeto desenvolvido para conter o êxodo rural, um desafio trazido pelo momento econômico em que o Brasil passava: o auge da industrialização. A instalação de fábricas na cidade e a geração de empregos despertou interesse de milhares de famílias do campo e, naquela época, havia um movimento contra o discurso de atrair mão de obra rural para alavancar o crescimento econômico, defendido principalmente pelo então Presidente da República, Getúlio Vargas. No acervo do CMB está um exemplar da Revista Nossa Terra, que circulou no Brasil n a década de 1930, com detalhes do modelo pedagógico adotado pela instituição.
Dois anos antes da posse de Juscelino Kubitschek, a São Paulo Alpargatas lançou “a calça que resiste a tudo”, denominada Far-West, feita com um tipo especial de tecido fabricado pela própria empresa, chamado “Brim Coringa”. Começava no país a era do jeans, de início usado principalmente no campo, onde moravam mais gente do que nas cidades. Por anos, a São Paulo Alpargatas se manteve como a única produtora do tecido índigo no Brasil.Na década de 90 a Santista Têxtil, criada pela Bunge, e a Divisão têxtil da São Paulo Alpargatas reúnem suas unidades de brins e índigo e criam uma das maiores empresas de Denin do mundo, a Alpargatas-Santista Têxtil, que na década de 2000 passou a se chamar apenas Santista Têxtil S.A. Nos anos seguintes, o jeans continuou a ser item coringa no dia a dia urbano, variando seus modelos de acordo com as tendências da moda.